Nasci em liberdade, vivi sempre em liberdade. Deste modo, recuso-me a falar desta data e do seu significado. Por muito que tente não consigo imaginar o que seria viver num Portugal acorrentado e em completa escuridão, trazida pelo manto negro de Salazar. Da mesma forma que, por muito que se tente, não se consegue colocar nos pés de alguém invisual ou surdo, apenas quem passou por aquela realidade pode com autoridade falar da falta de liberdade, da repressão, da fome.
Por vezes, perante as escolhas políticas que a democracia nos trouxe (os mesmos sempre a governar, alternância sem alternativa) apetece baixar os braços: escrever num blog ou discutir parece inconsequente, um desperdício. Um qualquer psicólogo diria que com esta crise atravessámos as cinco fases da dor: negação, ira, negociação, depressão e aceitação.
Aceitei que a maior parte das pessoas apenas tenta viver em paz, sem grandes ideais ideológicos ou ideias políticas, adaptando-se como melhor sabem às vicissitudes do seu tempo. Se esta atitude irrita-me (se calhar ainda estou na fase da ira) como teria sido para os que, diariamente e durante quarenta e oito anos, combateram a ditadura verificar que grande parte da população era relativamente indiferente à sua luta, que resignaram-se à inevitabilidade da censura e do fascismo.