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Dois Olhares

"Wovon man nicht sprechen kann, darüber muß man schweigen."

Nasci em liberdade, vivi sempre em liberdade. Deste modo, durante anos julguei que seria uma falta de respeito falar desta data e do seu significado porquanto por muito que tentasse não conseguiria imaginar o que seria viver num Portugal acorrentado e em completa escuridão, trazida pelo manto negro de Salazar; e, da mesma forma que, por muito que se tente, não se consegue colocar nos pés de alguém invisual ou surdo, apenas quem passou por aquela realidade poderia com autoridade falar da falta de liberdade, da repressão, da fome.

 

No entanto, Pynchon fez com que a minha opinião mudasse: "um ano e um lugar não precisam de incluir a nossa presença física para que exista um sentimento de pertença".  Este é o poder da história.

 

Por isso agora digo que o 25 de Abril também é meu. E será dos meus filhos, netos, bisnetos...

 

"A man gotta have a code"

Omar Little

 

Há um fascínio pela personagem Omar ("The Wire") semelhante ao que existe pela versão romantizada da Máfia. Em comum: ambos seguem um código de conduta; um contraponto ao actual zeitgeist: não é que não exista a noção de certo ou errado, acontece que já não existe sequer o certo

 

Não, antigamente o Mundo não era um paraíso de virtude. E sim, os mafiosos eram violentos, com nenhum respeito pela vida humana. O que importa, porém, é a percepção. Esta influencia o comportamento e reforça-se a si mesma. Parafraseado Naipaul, a personalidade de cada um é construída de acordo com as ideias que nos rodeiam. 

 

Ora, a cultura popular, desde as simples fábulas às longas-metragens de Hollywood, procuravam criar meta narrativas de uma certa moralidade. A sua hipocrisia foi, e bem, exposta, mas não surgiu nada em sua substituição. Ficou um vazio, uma sensação de ausência de limites, de barreiras, em que todos os meios são aceites e o sucesso é a medida de todas as coisas.

 

"E a tristeza tem sempre uma esperança..."

Vinicius de Moraes

 

Por este motivo a propaganda do Governo é tão poderosa. Ela corresponde a uma ânsia de acreditar que vai tudo melhorar, que nada foi em vão; todos os sacrifícios valeram a pena e que o futuro será melhor.

 

Com efeito, a propaganda para ter sucesso não precisa de ser verdadeira, nem verosímil, basta que corresponda a uma predisposição, a um desejo latente.

 

Pelo contrário, a satisfação é sempre incompleta. Somos insaciáveis, faz parte da nossa essência. E como tal os níveis de contentamento são ajustados a cada patamar atingido. Como escreveu Naipaul: "satisfaction solved nothing. It only opens up a new void, a fresh need." E, se mesmo assim, nem que seja por um instante, for atingida a satisfação plena esta é agridoce, pois que permanece a certeza que esta não pode durar para sempre.

 

Deste modo, será porventura mais fácil uma reeleição baseado nuns ligeiros e ténues sinais que demonstrem (mesmo que erroneamente) uma melhoria do que com o aviso Macmilaniano de "never had it so good".

 

A ser verdade quais são os incentivos que isto representa para um Governo em funções?

Na Assembleia da República assiste-se a mais um debate quinzenal. Nada de novo. Os mesmos argumentos retóricos repetidos uma e outra vez. O discurso pincelado com as palavras de ordem decidido por especialistas de marketing. 

 

No momento em que a alternativa se transformou em alternância iniciou-se a decadência da democracia, a morte acontece no momento que se decide que não há alternativas, que só há um caminho.

 

"...arranging and rearranging was Decadence, but the exhaustion of all possible permutations and combinations was death”

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