Eu fui praxado e praxei umas raras vezes - não só porque na qualidade de trabalhador-estudante o meu tempo escasseava mas sobretudo porque tinha coisas bem mais interessantes para fazer.
No entanto, num momento que associa-se a praxe a assassinos sociopatas que faz o "Das Experiment" parecer uma brincadeira de crianças, o que perante os relatos que por aí se ouvem não parece estar longe da verdade, gostava de dar o meu relato sobre a minha experiência de praxe (um exercício complicado face à tendência muito natural de se dar ênfase aos aspectos positivos do passado e esquecer os negativos).
Em teoria
Em teoria, o que é muitas vezes esquecido, a praxe serve os caloiros. Parece piada, eu sei, daí o uso do termo "teoria". Adiante.
O mais notório seria o peddy paper que era organizado anualmente pela praxe para que os caloiros - muitos acabados de chegar ao Porto pela primeira vez - pudessem conhecer os pontos mais importantes da cidade. Como é óbvio esta iniciativa não é representativa da praxe e podia (e devia) ser replicada pelas associações de estudantes.
Mais representativo da praxe é a "alcunha" dada aos caloiros, que usualmente reflectem uma determinada característica física. Esta deveria desconstruir esse "defeito", retirando-lhe a carga negativa. A "humilhação" do uso dessa alcunha, como outras igualmente benignas, serviria igualmente para estabelecer um espírito de grupo entre os caloiros contra os "doutores".
A praxe seria também um rito de passagem da juventude para a idade adulta: a "derradeira oportunidade" de se fazerem parvoíces em público.
Na prática
Na prática e na maior parte das vezes a praxe está ao serviço dos "doutores". Uns estão à procura de namoro. Outros, os mais perigosos, levam a praxe e eles próprios demasiado a sério: nada surpreendente para miúdos de 20 e poucos anos que estão pela primeira vez em contacto com uma situação real de poder (vd. "Das experiment").
Por outro lado, a praxe degrada-se porque sofre de um dos problema das falsas tradições: repetem acriticamente um comportamento apenas por que este existe no passado. A tradição pela tradição.
Conclusão
Ao contrário dos mitos dos defensores da praxe, esta não cria amizades, não integra - com efeito, do meu grupo de amigos (amigos mesmo) da faculdade, somente metade estiveram na praxe; estes nunca se sentiram excluídos nem foram coagidos a fazer parte.
É simplesmente uma carolice que serve ou devia servir para dar umas gargalhadas não à custa dos caloiros, mas com estes; não um conjunto de provas para serem superadas, com vista a ser alcançado o "lugar de doutor".
Tudo para além disto é abuso sem sentido.