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Dois Olhares

"Wovon man nicht sprechen kann, darüber muß man schweigen."

Heinrich Heine, poeta alemão do século XIX, escreveu o seguinte texto sobre o patriotismo alemão:

 

Fomos ordenados a ser patriotas, e logo nos tornamos patriotas, porque nós sempre obedecemos aos comandos dos nossos príncipes. Mas não se deve supor que a palavra "patriotismo" significa o mesmo na Alemanha como na França. O patriotismo dos franceses consiste no seguinte: o aquecimento do coração e, através deste calor ele se expande, se alarga de modo a englobar, com o seu amor todo-abrangente, não só o mais próximo e querido, mas toda a França, toda a civilização. O patriotismo dos alemães, ao contrário, consiste na redução e contracção do coração, assim como couro se contraí no frio; em odiar os estrangeiros, em deixar de ser europeu e cosmopolita, e na adopção de um germanismo tacanho e exclusivo.
Neste momento de reduzida soberania nacional a discussão de alternativas é inconsequente se não pugnarmos por uma mudança clara do patriotismo europeu - um patriotismo que se alargue. Porque uma união baseada na divisão entre credores e devedores é insustentável.

Da mesma forma que num grupo de trabalho cada elemento julga erroneamente que o seu contributo é superior ao dos restantes e que não lhe é dado o devido mérito, na União Europeia os países do Norte da Europa pensam o mesmo. 

Este sentimento corrente advêm de um viés cognitivo designado como heurística de disponibilidade: é-nos mais fácil recordar das nossas acções, estão presentes, disponíveis de imediato ao nosso pensamento do que as acções de outrem. 

Com este viés os referidos países sesquecem-se o que têm ganho - nomeadamente a Alemanha com a reunificação, dando paridade do marco alemão à ex-RDA -, o que ganham e o que continuariam a ganhar com a manutenção de uma união europeia.

O anúncio da passada sexta-feira de Passos Coelho a reduzir o salário mínimo nacional, decorrente da transferência de encargos das empresas para os trabalhadores, conseguiu violar o sentimento de justiça na maior parte dos portugueses. A partir daquele momento foi ultrapassado um limite, uma linha invisível que ninguém consegue explicar mas sentida por todos.

 

Eu nunca fui a nenhum manifestação, não porque não as achasse importantes ou não concordasse com o que defendiam, mas porque não via na minha intervenção qualquer efeito útil, isso e alguma preguiça.

 

E o que mudou para que eu tenha vontade de ir à manifestação marcada para o dia 15 de Setembro? Em termos políticos receio que irá ter efeitos quase nulos - gostava que tivéssemos um Governo que unisse o povo de forma a reivindicar junto da Europa alterações necessárias - mas procuro alguma paz de espírito, tomar uma posição hoje significa sair de casa, porque como disse Bevan "sabemos o que acontece a quem fica no meio da estrada. É atropelada." 

No eterno conflito entre a pessoa que somos e a pessoa que queremos ser há, como em todos as guerras, batalhas ganhas e batalhas perdidas. Algumas que nem chegam a ser travadas; perante um determinado acontecimento a rendição é a alternativa mais prudente.

 

Eu gostava de ser como aquelas pessoas que repudiam a rotina, que pulam constantemente entre vidas, que anseiam novos desafios, intrépidos viajantes do devir.

 

Mas não sou assim. O encerramento do café onde passava as minhas pausas de almoço forçou-me a admitir que não sou assim. Eu gosto de rotinas, da familiariedade da mesma mesa, o pedido que se torna dispensável. E, agora, ao frequentar outros cafés há um sentimento de desconforto, falta de pertença, fiquei orfão de café, que depois de todos os outros tipos de orfandade é o pior. 

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